Conde de Farrobo

O Conde de Farrobo - Memórias da sua vida e do seu tempo por Eduardo de Noronha, Edição Romano Torres, 1945.

13. O conde de Farrobo personifica vulto interessante do romantismo. O fastígio dessa curiosa fase vai até metade do século XIX. Só depois desta data a crítica implacável dos positivistas começa a bater em brecha o rijo bloco que brota, por assim dizer, da Renascença, e que se some de todo na crise do momento presente neste período de universal interrogação de 1945. Creio não exagerar classificando-o, apesar dos seus defeitos e talvez pieguices, de período áureo nos fastos da humanidade.

22/23. São muitos os antepassados que autenticam a linhagem nobre dos Quintelas. Cito apenas quatro dos mais próximos. Padre Diogo Mendes Quintela, presbítero, licenciado em direito canônico e escritor que desenvolveu a sua atividade nos fins do século XVI, princípios do XVII; Dr. Inácio da Costa Quintela, procurador da rainha D. Maria Ana de Ásutria, mulher de D. João V, no século XVII; Agostinho Inácio da Costa Quintela, fidalgo da Casa Real e escritor, autor de um Tratado sobre as vinhas, publicado em 1800; Inácio da Costa Quintela, vice-almirante, ministro da Marinha, sócio da Academia das Ciências, membro do Conservatório, escritor, poeta e músico, comandante da corveta Andorinha, de vinte e quatro coronadas, de 18, que se bateu no dia 18 de Maio de 1801 com a fragata francesa Chifone, de 44 peças, e que o inimigo honrou pela galhardia e bravura com que defendeu a bandeira das quinas.

23/24. Do enlace de Valério José Duarte Pereira com D. Ana Joaquina de Quintela, nasceu em Lisboa, a 20 de Agosto de 1748, Joaquim Pedro Quintela. O pai possuía, herdado dos antepassados, o título de Cavaleiro-Fidalgo da Casa Real e cavaleiro de Cristo; fruía a propriedade do ofício de escrivão das apelações civis, das Ilhas, e dos crimes da comarca de Torres-Vedras, etc. A mãe provinha de lídima estirpe. Teve por avô paterno Belchior Araújo e, por pai, Joaquim Lobato de Araújo e Costa, irmão de Lucas José de Araújo Lobato de Abreu e Lima, ambos com o uso de brasão desde 1799, como registra o Arquivo Heráldico Genealógico. Aparecem constantemente Quintelas nos documentos oficiais e em publicações particulares; assim, por exemplo, acentuava-se que D. Teresa Soares se consorciou com Abílio Pires de Quintela. Noutra parte se inscreve que a condessa D. Maria Gertrudes Quintela foi senhora do morgado instituído por seu pai para ela. (1)
Referências de igual teor se leem no Nobiliário del conde D. Pedro e Nobiliário de Famílias de Portugal, de Felgueiras Gaio. Pertencia à Casa de Juste dos Abreus, senhores de Regalados, representados hoje pelos Siqueiras, Freires (S. Martinho). A mãe ostentava ressonante prosápia de aristocracia. O pai hauria existência de elevada nobreza forense, venerada e respeitada em todos os países e que entre nós se notabilizou por chanceleres e jurisconsultos de perdurável renome.
(1) As crônicas do reinado de D. Dinis já se referem à família dos Quintelas.

25/26. Joaquim Pedro Quintela entrou na posse dos copiosos bens dos seus progenitores em Março de 1782 e nas dos tios paternos Luís Rebêlo Quintela, juiz dos Feitos da Coroa e Fazenda da Casa de Suplicação e desembargador dos Agravos do mesmo tribunal, e de Inácio Pedro Quintela, familiar do Santo Ofício, negociante de grosso trato na Rua Nova e outorgante em diversos Contratos Reais, vogal presidente da Junta do Comércio, fábricas e navegação, etc. Os dois tios eram filhos de António Gomes Rebêlo e de sua mulher D. Madalena de Jesus. Como se vê, eram entidades de subida importância.
Joaquim Pedro instituiu o morgado de Quintela. O total inspirou aos avaliadores a soma de 424.316$787 réis, mais de um milhão de cruzados. A munificência régia concede-lhe a 13 de Agosto de 1802 a alcaidia-mor da vila da Sortelha e a 13 de Dezembro do mesmo ano o senhorio da vila do Préstimo. Matrimonia-se com D. Maria Joaquina Xavier de Saldanha, filha de Joaquim Lobato de Araújo e Costa, da Casa de Juste em Braga, e de sua mulher D. Maria Leonor Xavier de Saldanha, e já a esse tempo era fidalgo da Casa Real. Não tardou que a premiar as suas especiais aptidões pertencesse ao Conselho da Rainha D. Maria I, e fosse comendador do Forno de Palhavã na Ordem de S. Tiago da Espada, Cavaleiro professo da Ordem de Cristo.

26/27. A 17 de Agosto de 1805, o príncipe regente D. João concede-lhe o título de barão de Quintela em duas vidas. A 26 desse mesmo mês, decorridos nove dias, fina-se a esposa. Não tem o gosto de saber que fora elevada a esse título, pois o seu estado de saúde não lho permitia. O brasão de armas dado em 12 de Outubro de 1806 consiste no seguinte: em campo de púrpura, duas bandas de escaques de ouro de uma só ordem, elmo de aço, aberto, e não tem timbre. A baronia de Joaquim Pedro Quintela não o impede de intervir na marcha dos mais altos negócios do país. Assim, em 1811, a firma Quintela & Companhia evidencia-se entre os armadores e carregadores da marinha mercante nacional com carreira para os portos da Ásia. Negocia em chá, em pedras preciosas e gêneros peculiares a esse continente. Os lucros da firma, fornecidos ao fisco, só totalizavam, em 1814, 8.000$00. Ressaltam igualmente da Ásia e dos seus produtos, do azeite de baleia, das fábricas de lanifícios da Covilhã e Fundão. A sua atividade industrial alonga-se à seção bancária. Por exemplo, tendo a Casa Real encomendado mobiliário, damascos, sedas e outras fazendas luxuosas em Paris, foi a firma Quintela que liquidou a despesa mediante letras sacadas sobre Mr. Jean Dupontet Fils, à ordem do embaixador de Portugal D. Vicente de Sousa Coutinho.

27/28. Os Quintelas, à moda dos Médicis florentinos, simultaneamente príncipes reinantes, negociantes de alta categoria e banqueiros com correspondentes, depósitos e créditos, por assim dizer, ilimitados, aparentavam-se com as famílias mais nobres. Só lhes faltou, e por pouco, terem, como sucedeu a Catarina e Maria daquela ilustre família italiana, apetados laços matrimoniais com Henrique II e Henrique IV de França. Quando o primeiro Barão de Quintela faleceu, a 1 de Outubro de 1817, já tinham pago o seu tributo à morte os irmãos João, Joaquim Pedro Quintela e Félix José Pereira Quintela, que deixava viva, à data do testamento feito a 1 de Outubro de 1817, D. Gertrudes Narcisa Inácia Quintela. Dos quatro irmãos, só um usou o apelido Pereira, do pai.

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